Em seguida devemos tratar da distinção das virtudes morais entre si. E sobre esta questão cinco artigos se discutem:
(III Sent., dist. XXXIII, q. 1, a. qª 1). O primeiro discute-se assim. — Parece que há só uma virtude moral.
1. — Pois, assim como a direção dos atos morais pertence à razão, sujeito das virtudes intelectuais, assim a inclinação pertence à virtude apetitiva, sujeito das virtudes morais. Ora, é uma só a prudência, virtude intelectual diretora de todos os atos morais. Logo, também é uma só a virtude moral, que imprime a inclinação em todos os atos morais.
2. Demais. — Os hábitos não se distinguem pelos objetos materiais, mas pelas razões formais dos objetos. Ora, a razão formal do bem, a que se ordena a virtude moral, a saber, o modo da razão, é uma só. Logo, é uma só a virtude moral.
3. Demais. — Os atos morais se especificam pelo fim, como já dissemos. Ora, o fim comum de todas as virtudes morais é um só, a saber, a felicidade, enquanto os fins próprios e próximos são infinitos. Ora, não sendo as virtudes morais infinitas, conclui-se que é uma só a virtude moral. Mas, em contrário, um mesmo hábito não pode pertencer a diversas potências, como já se disse. Ora, o sujeito das virtudes morais é a parte apetitiva da alma, que se divide em várias potências, como já se disse na Primeira Parte. Logo, não pode haver uma só virtude moral.
SOLUÇÃO. — Como já dissemos, as virtudes morais são certos hábitos da parte apetitiva. Ora, estes diferem especificamente conforme as diferenças especiais dos objetos, conforme estabelecemos. Ora, espécie do objeto desejável, como a de qualquer coisa, depende da forma específica, procedente do agente. Devemos porém considerar, que a matéria do paciente tem dupla relação com o agente. Às vezes recebe a forma do agente, essencialmente, tal como existe no agente; e isso se dá com todos os agentes unívocos. E portanto, é necessário que, sendo o agente especificamente uno, a matéria receba também forma especificamente una; assim, o fogo não gera, univocamente, senão o que é de espécie ígnea. Outras vezes, porém, a matéria recebe a forma do agente, não essencialmente, tal como ela nele existe, e é o caso dos geradores não unívocos; assim, o animal é gerado pelo sol. E então as formas recebidas na matéria, provenientes do mesmo agente, não são da mesma espécie, mas se diversificam conforme a matéria está diversamente proporcionada a receber o influxo do agente. Assim, vemos que a mesma ação do sol gera, por putrefação, animais de diversas espécies, segundo a proporção diversa da matéria. Mas, como é manifesto, na ordem moral a razão é que ordena e move, sendo a potência apetitiva a ordenada e movida. Ora, o apetite não respeita, quase univocamente, a impressão da razão, por não ser racional por essência, mas por participação, como se disse. Por onde, o desejável, conforme a moção racional, tem tantas espécies diversas, quantas as relações diversas que mantém com a razão. Donde se segue que, longe de constituírem uma só virtude, as virtudes morais são especificamente diversas.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O objeto da razão é a verdade. Ora, todos os atos morais, sendo de existência contingente, manifestam a mesma essência da verdade. Portanto, há neles só uma virtude dirigente, que é a prudência. O objeto da potência apetitiva porém é o bem desejado, cuja essência difere conforme a relação diversa mantém com a razão dirigente.
RESPOSTA À SEGUNDA. — As formalidades em questão são do mesmo gênero por causa da unidade do agente; mas, se diversificam especificamente, por causa das relações diversas dos pacientes, como acima dissemos.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Os atos morais não se especificam pelo fim último, mas pelos fins próximos; e estes, embora numericamente infinitos, não o são contudo especificamente.
(III Ethic., lect. VIII). O segundo discute-se assim. — Parece que as virtudes morais não se distinguem entre si por serem, umas, relativas às obras e outras, às paixões.
1. — Pois, como diz o Filósofo, a virtude moral versa sobre o prazer e a tristeza e obra o que é ótimo. Ora, o prazer e a tristeza são paixões, como já se disse. Logo, a mesma virtude, que versa sobre as paixões, versa também, como operativa, sobre as obras.
2. Demais. — As paixões, sendo princípios das obras externas, as virtudes que as retificam, hão-de, conseqüente e necessariamente, retificar também as obras. Logo, as mesmas virtudes morais versam sobre as paixões e sobre as obras.
3. Demais. — O apetite sensitivo é movido, bem ou mal, a todas as obras exteriores. Ora, estes movimentos são paixões. Logo, as mesmas virtudes, que versam sobre as obras versam também sobre as paixões. Mas, em contrário, o Filósofo diz que a justiça versa sobre as obras; e por outro lado, a temperança, a fortaleza e a mansidão, sobre certas paixões.
SOLUÇÃO. — A obra e a paixão podem se relacionar de dois modos com a virtude. Primeiro, como efeito e então toda virtude moral produz certas obras boas, e uma certa deleitação ou tristeza, que são paixões, como já dissemos. — Em segundo lugar, a obra pode relacionar-se com a virtude moral, como a matéria sobre a qual versa. E então, das virtudes morais, umas versam sobre as obras e outras, sobre as paixões. E a razão disto está em o bem e o mal de certas obras nelas mesmas se fundarem, como quer que o homem seja afetado por elas; i. é, o bem e o mal delas depende da relação de medida com outra coisa. Assim sendo, é necessário haver uma virtude diretiva das obras, em si mesmas; tal é o caso da compra e venda, e atos semelhantes, nos quais se leva em conta a relação de débito ou de não-débito para com outrem. E por isso a justiça e as suas partes dizem respeito propriamente às obras, como sua matéria adequada. — O bem e o mal de outras porém se fundam só na relação de medida com o sujeito delas. E por isso neste caso é necessário levar em conta o modo bom ou mau por que este é afetado; e por conseqüência necessária, as virtudes, relativas a essas obras versam principalmente sobre os afetos internos chamados paixões da alma; e isso se dá com a temperança, a fortaleza e virtudes semelhantes. Ora, pode acontecer que, nas obras relativas a outrem, seja posposto o bem da virtude pela paixão desordenada da alma. E então, desaparecida a relação de medida da obra exterior, há de desvanecer-se a justiça; e a desaparição corrompida da relação de medida das paixões interiores acarretará a desaparição de alguma outra virtude. Assim, quem levado da ira, fere indebitamente outrem, lesa ao mesmo tempo a justiça; ao passo que a ira imoderada elimina a mansidão. E o mesmo se dá nos casos semelhantes. E daqui se deduzem as RESPOSTAS ÀS OBJEÇÕES. — Pois, a primeira objeção se funda na obra enquanto efeito da virtude. — As outras duas se fundam em que o ato e a paixão concorrem para o mesmo fim; mas, em certos casos, a virtude versa principalmente sobre a obra — e, em outros, sobre a paixão, pela razão já exposta.
O terceiro discute-se assim. — Parece que só uma virtude moral é a que versa sobre as obras.
1. — Pois, a retidão de todos os atos externos pertence à justiça. Ora, esta é uma virtude. Logo, só há uma virtude que diz respeito a elas.
2. Demais. — Há uma diferença máxima entre as obras ordenadas ao bem individual e as ordenadas ao bem comum. Mas esta diferença não diversifica as virtudes morais; pois, como diz o Filósofo, a justiça legal, que ordena os nossos atos para o bem comum, não difere da que os ordena para o nosso bem individual, senão por uma diferença de razão. Logo, a diversidade das obras não causa a das virtudes morais.
3. Demais. — Se a obras diversas se referissem virtudes morais diversas, seria necessário que tal fosse a diversidade das virtudes morais qual a das obras. Ora, isto é claramente falso, pois à justiça pertence estabelecer a retidão dos diversos gêneros são só das trocas, como das distribuições, conforme se vê em Aristóteles. Logo, a obras diversas não correspondem virtudes diversas. Mas, em contrário, a religião é uma virtude diferente da piedade; contudo, uma e outra versa sobre determinados atos.
SOLUÇÃO. — Todas as virtudes morais, que versam sobre as obras, convêm numa noção geral de justiça, que se funda no devido a outrem; distinguem-se porém por diversas razões especiais. E isto porque a ordem racional dos atos externos se funda, como já dissemos, não na relação com o afeto humano, mas na conveniência da causa consigo mesma, da qual deduzimos a idéia do devido, que funda a noção de justiça, a qual exige paguemos o débito. E portanto, todas as virtudes, como ela, que versam sobre as obras, participam de certo modo da justiça. Mas a noção de débito não é a mesma em todos os casos. Assim, umas vezes devemos ao nosso igual; outras, ao superior; outras, a um inferior; umas vezes, em virtude de um contrato, outras, de uma promessa ou por um benefício recebido. Ora, a estas idéias diversas de débito correspondem virtudes diversas; assim, pela religião damos a Deus o que lhe é devido; a piedade nos manda pagar o débito aos pais ou à pátria; o agradecimento, aos benfeitores e assim por diante.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A justiça propriamente dita é uma virtude especial fundada em a noção perfeita de débito, susceptível de ser satisfeito por equivalência. Mas também se chama justiça, em sentido mais amplo, a virtude que exige a satisfação de qualquer débito. E nesta última acepção ela não é uma virtude especial.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A justiça, que visa o bem comum, é uma virtude diferente da ordenada ao bem privado de alguém; e por isso o direito comum se distingue do direito privado, e Túlio admite uma virtude especial, a piedade, ordenada ao bem da pátria. Ora, a justiça, que ordena o homem para o bem comum, tem um império geral, pois ordena todos os atos das virtudes ao devido fim, que é o bem comum. Mas também a virtude se chama justiça, que é ordenada pela justiça, no primeiro sentido. Por onde, a virtude só racionalmente difere da justiça legal, assim como só racionalmente difere a virtude, que obra por si mesma, da que o faz por império de outra.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Todas as obras pertencentes à justiça especial supõem a mesma noção de débito. E portanto, constituem a mesma virtude da justiça, principalmente quanto às trocas. Mas talvez, a justiça distributiva é de espécie diferente da comutativa, questão esta de que mais adiante se tratará.
O quarto discute-se assim. — Parece que a paixões diversas não correspondem virtudes morais diversas.
1. — Os objetos de um mesmo hábito convêm no princípio e no fim, como se vê sobretudo nas ciências. Ora, todas as paixões têm um mesmo princípio, que é o amor; e todas terminam num mesmo fim, que é o prazer ou a pena, como já vimos. Logo, é só uma a virtude moral correspondente a todas as paixões.
2. Demais. — Se a paixões diversas se referissem virtudes morais diversas, estas seriam tantas quantas aquelas. Ora, isto é falso evidentemente; pois, a mesma é a virtude moral que versa sobre paixões opostas; assim, a fortaleza versa sobre o temor e a audácia; a temperança, sobre o prazer e a dor. Logo, não é necessário que as paixões diversas correspondam virtudes morais diversas.
3. Demais. — O amor, a concupiscência e o prazer são paixões especificamente diferentes, como já se estabeleceu. Ora, só a temperança é a virtude moral que lhes diz respeito a todas. Logo, a paixões diversas não correspondem virtudes morais diversas. Mas, em contrário, a fortaleza é relativa ao temor e à audácia; a temperança, à concupiscência; a mansidão, à ira, como se disse.
SOLUÇÃO. — Não se pode dizer que uma só virtude moral corresponda a todas as paixões. Pois, estas pertencem a potências diversas: umas, ao irascível, outras, ao concupiscível, como já dissemos. Nem todas as diversidades das paixões bastam, necessariamente, a diversificar as virtudes morais. — Primeiro, porque certas paixões se opõem por contrariedade; assim, a alegria e a tristeza, o temor e a audácia, e outras. Ora, a essas paixões assim opostas corresponde, necessariamente, uma mesma virtude. Pois, a virtude moral, consistindo numa certa mediania, é pela mesma razão que se estabelece o meio termo entre paixões contrárias, assim como, em a natureza, os contrários, como o branco e o preto, têm o mesmo meio termo. — Segundo, porque há diversas paixões repugnantes à razão, do mesmo modo, i. é, impelindo ao que a contraria, ou retraindo do que ordena. E portanto, as diversas paixões do concupiscível não pertencem a virtudes morais diversas. Pois os movimentos delas se seguem uns aos outros segundo uma certa ordem, como ordenados ao mesmo fim, que é a busca do bem ou a fuga do mal. Assim, do amor procede a concupiscência, e esta nos leva ao prazer. E o mesmo se dá nos casos opostos, pois do ódio resulta a fuga ou a abominação, que conduz à dor. As paixões do irascível, pelo contrário, não pertencem a uma mesma ordem, mas se ordenam a termos diversos. Assim, a audácia e o temor ordenam-se a algum perigo grave; a esperança e o desespero, a um bem árduo; a ira, enfim, a superar um contrário nocivo. E portanto, a estas paixões ordenam-se virtudes diversas; assim, a temperança se ordena às paixões do concupiscível; a fortaleza, ao temor e à audácia; a magnanimidade, à esperança e ao desespero; a mansidão, à ira.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Todas as paixões convêm num princípio e num fim comum; não porém num princípio ou fim próprio. Por onde, a objeção se baseia no que não basta à unidade da virtude moral.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Assim, como nos fenômenos naturais, por um mesmo princípio se afastam de um princípio e se achegam a outro; e, na ordem racional, os contrários têm o mesmo fundamento, assim também a paixões contrárias se refere uma mesma virtude moral, que, a modo da natureza, concorda com a razão.
RESPOSTA À TERCEIRA. — As três paixões referidas se ordenam ao mesmo objeto, por uma certa ordem, como já dissemos. E portanto, pertencem à mesma virtude moral.
O quinto discute-se assim. — Parece que as virtudes morais não se distinguem pelos objetos das paixões.
1. — Pois, os objetos das paixões são como os das operações. Ora, as virtudes morais, que versam sobre as operações não se distinguem pelos objetos destas; assim, à mesma virtude da justiça pertence vender e comprar uma casa ou um cavalo. Logo, nem as virtudes morais, que versam sobre as paixões, se diversificam pelos objetos destas.
2. Demais. — As paixões são atos ou movimentos do apetite sensitivo. Ora, a diversidade dos hábitos é maior que a dos atos. Logo, objetos diversos, que não diversificam as espécies de paixões, também não diversificarão as das virtudes morais; de modo que, só urna virtude moral versa sobre todos os objetos deleitáveis, e assim com os demais objetos.
3. Demais. — O mais e o menos não diversificam as espécies. Ora, os diversos objetos deleitáveis não diferem senão pelo mais e pelo menos. Logo, todos pertencem à mesma espécies de virtude. E pela mesma razão, todos os que nos causam terror e assim por diante. Logo, as virtudes morais não se distinguem pelos objetos das paixões.
4. Demais. — A virtude tanto obra o bem como impede o mal. Ora, são várias as virtudes que versam sobre o desejo do bem; assim, a temperança, sobre o desejo dos deleites do tacto; a eutrapelia, sobre os prazeres das diversões. Logo, hão-de ser também diversas as virtudes que versam sobre o temor dos males. Mas, em contrário, a castidade versa sobre os prazeres venéreos; a abstinência, por seu lado, sobre os da mesa; e a eutrapelia, sobre os das diversões.
SOLUÇÃO. — A perfeição da virtude depende da razão, ao passo que a da paixão depende do próprio apetite sensitivo. Por onde é necessário às virtudes se diversifiquem pela relação que mantêm com a razão; e as paixões, pela que mantêm com o apetite. E portanto, o diverso ordenar-se dos objetos das paixões ao apetite sensitivo causa as diversas espécies delas; e enquanto relacionadas com a razão, causam as diversas espécies de virtudes. Ora, o movimento da razão não é o mesmo que o do apetite sensitivo. Logo, nada impede uma diferença de objetos, que causa a diversidade das paixões, não cause a diversidade das virtudes, como no caso de uma virtude versar sobre muitas paixões, segundo já dissemos. E também uma diferença de objetos pode causar a das virtudes, sem causar a das paixões; assim, quando diversas virtudes se ordenam a uma mesma paixão, p. ex., o prazer. Ora, diversas paixões, pertencentes a potências diversas, sempre pertencem a virtudes diversas, como já dissemos. Logo, a diversidade dos objetos relativa à das potências sempre diversifica as espécies de virtudes; assim, se um bem é absoluto e outro, acompanhado de certa dificuldade. E como a razão rege, numa certa ordem, as partes inferiores do homem, e mesmo se ,estende ao exterior, daí vem que o objeto da paixão se relaciona diversamente com a razão, e portanto é de natureza a diversificar as virtudes, conforme é apreendido pelos sentidos, pela imaginação, ou mesmo pela razão; ou conforme pertence à alma, ao corpo ou às coisas exteriores. Logo, o bem do homem, que é o objeto do amor, da concupiscência e do prazer pode ser considerado como pertencente ao sentido corpóreo ou à apreensão interior da alma. E isto quer se ordene ao bem do homem em si mesmo, quanto ao corpo ou quanto à alma; quer se ordene ao bem de um homem em relação aos outros. E toda diversidade tal diversifica as virtudes, por causa da ordem diversa que mantém com a razão. Assim pois qualquer bem considerado pertencerá à virtude da temperança, se for apreendido pelo sentido do tacto, e se disser respeito á conservação individual ou específica da vida humana, como o prazer da alimentação e os venéreos. Os prazeres porém dos outros sentidos, não sendo veementes, e não opondo qualquer dificuldade à razão, não há nenhuma virtude que a eles se refira; pois a virtude, como a arte, versa sobre o difícil, segundo já se disse. Por outro lado, o bem apreendido, não pelo sentido mas pela virtude interior e pertencente ao homem em si mesmo, e como o dinheiro e a honra; aquele se ordena, em si mesmo, ao bem do corpo, e esta consiste numa apreensão da alma. E estes bens podem ser considerados ou absolutamente, enquanto pertencentes ao concupiscível, ou enquanto acompanhados de certa dificuldade e pertencentes ao irascível. Esta distinção porém não tem lugar em relação aos bens que deleitam o tacto, que são uns bens ínfimos e cabem ao homem pelo que tem de comum com os brutos. Por onde, a liberalidade versa sobre o bem do dinheiro, absolutamente considerado, enquanto objeto da concupiscência, do deleite ou do amor. E quando esse bem é acompanhado de dificuldade, enquanto objeto da esperança, constitui o objeto da magnificência. — Por outro lado, o bem sobre o qual versa a honra, considerado absolutamente, enquanto objeto do amor, é uma virtude chamada filotimia, i. é, amor da honra. Considerado porém como difícil, enquanto objeto da esperança, constitui a magnanimidade. E assim se conclui que a liberalidade e a filotimia pertencem ao concupiscível; ao passo que a magnificência e a magnanimidade, ao irascível. Por fim, o bem do homem em relação aos outros não implica nenhuma dificuldade, mas é tomado na sua acepção absoluta, como objeto das paixões do concupiscível. E este bem pode nos ser agradável enquanto nos damos a outrem, ou naquilo que fazemos seriamente, i. é, nos atos ordenados ao fim devido; ou naquilo que fazemos por divertimento, i. é, nos atos ordenados unicamente ao prazer, que não se comportam para com a razão do mesmo modo que os primeiros. Pois, nas causas sérias, comportamo-nos para com os outros de dois modos. Ou tornando-nos agradáveis por palavras e obras, o que pertence à virtude por Aristóteles denominada amizade, e que também pode se chamar afabilidade. Ou manifestando-nos por ditos e fatos, o que pertence à outra virtude chamada verdade. Ora, a manifestação tem mais de racional que a deleitação, e as coisas sérias, que as jocosas. E por isso é outra a virtude relativa aos deleites das diversões e a que o Filósofo chama eutrapelia. É pois claro que, segundo Aristóteles, são onze as virtudes morais relativas às paixões, a saber: a fortaleza, a temperança, a liberalidade, a magnificência, a magnanimidade, a filotimia, a mansidão, a amizade, a verdade, a eutrapelia e a justiça. E se distinguem pelas matérias, paixões e objetos diversos. E se, por fim, lhes acrescentarmos a justiça, que versa sobre as obras, serão ao todo doze.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Todos os objetos de uma mesma obra, especificamente, mantêm a mesma relação com a razão; não porém todos os objetos da mesma paixão, especificamente; porque as obras não podem, como os paixões, repugnar à razão.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Uma é a razão que diversifica as paixões e outra a que diversifica as virtudes, como já dissemos.
RESPOSTA À TERCEIRA. — O mais e o menos não diversificam a espécie, senão pela relação diversa com a razão.
RESPOSTA À QUARTA. — O bem tem maior força de atração que o mal porque este não age senão em virtude daquele, como diz Dionísio. E por isso, o mal não opõe nenhuma dificuldade à razão que exija uma virtude, salvo se ele for grande: e esse é único em cada gênero de paixão. Assim, a mansidão é a única virtude oposta à ira, e a fortaleza a única que versa sobre a audácia. Ao passo que a dificuldade proveniente do bem, exige virtude, embora não seja grande o bem em cada gênero de paixão. E por isso há várias virtudes morais que versam sobre as concupiscências, como já dissemos.