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Suma Teológica

Summa Theologiae

Questões

Quaestiones
supplementum Q.46

Do consentimento seguido de um juramento ou da conjunção carnal.

Em seguida devemos tratar do consentimento seguido de um juramento ou da conjunção carnal. Sobre cuja questão discutem-se dois artigos:

Art. 1 — Se o juramento adjunto ao consentimento num casamento futuro, implica o matrimônio.

O primeiro discute-se assim. ─ Parece que o juramento, adjunto ao consentimento num casamento futuro, implica o matrimônio.

1. Pois, ninguém pode obrigar-se a praticar um ato contrário ao direito divino. Ora, cumprir o juramento é exigido pelo direito divino, conforme aquilo do Evangelho: Cumprirás ao Senhor os teus juramentos. Logo, nenhuma obrigação subsequente pode autorizar o não cumprimento de um juramento anteriormente feito. Portanto, quem, depois de ter consentido em casar com uma mulher, futuramente, obrigar-se com outra, por palavras de presente, fica contudo adstrito ao dever de cumprir o juramento anterior. Ora, isto não se daria se esse juramento não obrigasse ao matrimônio prometido. Logo, o juramento adjunto ao consentimento num matrimônio futuro, obriga ao matrimônio.

2. Demais. ─ A verdade divina tem mais força que a humana. Ora, pelo juramento, fundamos o valor da nossa palavra na veracidade divina. Por onde, como as palavras de presente, expressivas do matrimônio, e só fundadas na veracidade humana implicam o matrimônio, parece que com muito maior razão pode produzir esse efeito a promessa de um matrimônio futuro feita sob juramento.

3. Demais. ─ Segundo o Apóstolo, o juramento é a maior segurança para terminar todas as contendas. Logo, ao menos num futuro, devemos dar maior valor a um juramento que a uma simples palavra. Depois, se alguém consentir na promessa, por palavras de presente a se casar com uma mulher, depois de ter consentido verbalmente num casamento futuro com outra, por juramento, deve, por juízo da Igreja, ser compelido a casar com a primeira e não com a segunda.

4. Demais. ─ O simples fato de pronunciar as palavras, que comprometem a um matrimônio futuro, tem como efeito os esponsais. Ora, para estes também o juramento produz o seu efeito. Logo, tem maior alcance que os esponsais. Ora, além dos esponsais só há, o matrimônio. Logo, o juramento tem o matrimônio como feito. Mas, em contrário. ─ O que há de ser ainda não é. Ora, um juramento acrescentado não pode fazer com que a promessa verbal de um matrimônio futuro deixe de exprimir um acontecimento futuro. Logo, ainda não haverá então o matrimônio.

2. Demais. ─ Depois de o matrimônio perfeito, não há necessidade de nenhum outro consentimento para a existência dele. Ora depois do juramento ainda há necessidade de outro consentimento para haver matrimônio; do contrário seria inútil jurar, que o casamento haveria de se realizar. Logo, não produz o matrimônio.

SOLUÇÃO. ─ Recorremos ao juramento para confirmar as nossas palavras. Por onde, o juramento só confirma o que foi dito, nem lhe muda o significado. Ora, palavras que exprimem um matrimônio futuro não tem, pela sua significação mesma como deito, o matrimônio, porque o prometido como futuro ainda não é. E assim, mesmo acrescentando-se o juramento, ainda não está perfeito o matrimônio como o diz o Mestre das Sentenças.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Cumprir um juramento lícito nos é imposto por direito divino; não porém cumprir um juramento ilícito. Por onde, se uma obrigação subsequente ao juramento o tornar ilícito de lícito que antes era, não encontrará o direito divino quem não cumprir o juramento anteriormente feito. Ora, tal o que se dá no caso vertente. Pois, jura ilicitamente quem ilicitamente promete. Ora, prometer o alheio é ilícito. Por onde, o consentimento subsequente por palavras de presente, pelo qual alguém transfere o domínio do seu corpo a outrem, torna ilícito o juramento, de antes lícito.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A verdade divina é eficacíssima para confirmar aquilo para o que a tomamos como testemunho.

DONDE SE DEDUZ A RESPOSTA À TERCEIRA OBJEÇÃO.

RESPOSTA À QUARTA. ─ O efeito produzido pelo juramento é não criar uma nova obrigação, mas confirmar a já feita. E assim mais gravemente peca quem a viola.

Art. 2 — Se a conjunção carnal, depois das palavras que exprimem o consentimento num matrimônio, tem o matrimônio como efeito.

O segundo discute-se assim. ─ Parece que a conjunção carnal, depois das palavras. que exprimem o consentimento num matrimônio futuro, tem o matrimônio como efeito.

1. Pois, consentir por atos é mais do que o fazer por palavras. Ora, consentir no comércio sexual é consentir por atos numa promessa anteriormente feita. Logo, parece que desse modo muito mais se conserva o matrimônio, que se nele fosse consentido apenas por palavras de presente.

2. Demais. ─ O consentimento, não só expresso, mas também interpretativo, tem como efeito o matrimônio. Ora, nenhuma interpretação do consentimento é mais indubitável que a conjunção carnal. Logo, desse modo se perfaz o matrimônio.

3. Demais. ─ Toda conjunção carnal fora dos limites do matrimônio é pecado. Ora, não peca a mulher que admite o marido à conjunção carnal. Logo, por esta se perfaz o matrimônio.

4. Demais. ─ Não se perdoa o pecado senão com a restituição do que foi furtado. Ora, ninguém pode restituir à mulher que deflorou, com promessa de matrimônio, o bem da sua virgindade, senão unindo- se com ela pelo matrimônio. Logo, parece que não obstante depois da conjunção carnal, contrair matrimônio com outra por palavras de presente, está obrigado a voltar a viver com a primeira. Ora, isso não se daria se entre eles não existisse o matrimônio. Logo, a cópula carnal, depois do consentimento num matrimônio futuro, produz o matrimônio. Mas, em contrário, diz Nicolau I Papa: Faltando o consentimento para o casamento, tudo o mais que se faça, mesmo a conjunção carnal, é nulo.

2. Demais. ─ O que resulta de uma coisa não na produz. Ora, a conjunção carnal resulta do matrimônio, como o efeito, da causa. Logo, não pode ser causa do matrimônio.

SOLUÇÃO. ─ Podemos considerar o matrimônio a dupla luz. Primeiro, relativamente ao foro da consciência. E então, na verdade das coisas, a conjunção carnal não pode consumar um matrimônio, já precedido de esponsais, que o prometiam como futuro, desde que faltou o consentimento interior. Pois, as palavras de presente, mesmo expressivas de consentimento, não teriam o matrimônio como efeito, se faltasse o consentimento interior. Em segundo lugar, podemos considerar o matrimônio quanto ao juízo da Igreja. E então, como no juízo externo se julga pelo exteriormente manifesto, e nada podendo mais expressamente significar que a conjunção carnal o consentimento, por isso, segundo o juízo da Igreja, essa conjunção, subsequente aos esponsais, consuma o matrimônio; salvo se se descobrirem sinais expressos de dolo e de fraude.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Quem conserva a conjunção carnal, é que nela realmente consentiu. Mas daí não se deduz que consentisse no matrimônio, senão por uma presunção de direito.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Essa interpretação não altera a realidade das coisas, mas o juízo, fundado no que se manifesta exteriormente.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ A noiva que admitir o noivo, crendo que este quer consumar o matrimônio, fica escusada do pecado, salvo provas de fraude manifesta, como condições muito desiguais quanto à nobreza ou quanto à fortuna, ou sinais semelhantes. Mas o noivo, além do pecado de fornicação, comete o da fraude.

RESPOSTA À QUARTA. ─ Em tal caso o noivo está obrigado a abster-se de outra, e casar com a mulher que deflorou, se forem da mesma condição ou se for a noiva de condição superior. Mas, casando com outra, já fica incapaz de cumprir a promessa a que estava adstrito. Por isso cumpre o seu dever se providenciar sobre o casamento dela. Mas a isto também não está obrigado, na opinião de certos, se for de condição muito superior à dela ou se houver algum sinal evidente de fraude. Pois, pode-se presumir com probabilidade, que a noiva não foi enganada, mas finge sê-lo.